Deletar, protocolar, penalizar e outros verbos

Jocélia Borges, de São Paulo, quer saber qual o correto e qual a diferença entre protocolar e protocolizar. E Sandra Regina Martins, de Florianópolis, pergunta sobre "alguns verbos de cunho técnico e que não constam no dicionário, tipo disponibilizar, itemizar, customizar e outros do gênero. Às vezes preciso utilizar algum desses verbos e não sei se devo".
Digamos que você pode, Sandra. "Tudo o que se vê tem um nome" (PVOLP, 1999, p. XXII) e tudo o que se faz também é denominado. Se o ser humano cria objetos, inventa instrumentos e descobre novos afazeres, precisa dar-lhes nomes, que vão sendo incorporados à língua. A questão é que normalmente na área técnica e científica eles têm vindo do inglês, e aí deveriam pelo menos sofrer uma nacionalização na ortografia. Por que escrever ticket ou copydesk se podemos escrever tíquete e copidesque? Ou 'linkar' no lugar de lincar? Na verdade, por que lincar se temos ligar? Por que deletar e não apagar? A resposta pode ser dada pelo presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL), Arnaldo Niskier: "O certo é que a língua portuguesa cresceu, até mesmo em virtude da introjeção de termos ligados ao desenvolvimento científico e tecnológico e de muitos estrangeirismos.(...) Não há como conter esse crescimento, mesmo que, por vezes, seja ele fruto de (...) um lamentável 'lingüicídio', palavra que, aliás, consta do nosso Vocabulário". Refere-se ele ao Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (PVOLP), organizado pela ABL, cuja edição de 1999 registra a grafia correta e a classe gramatical de 350 mil verbetes. Nele já constam vocábulos como lincar, deletar e site, o que tem sido motivo de algumas críticas.
Outro fator que responderia a essa fácil adesão ao estrangeirismo - mesmo nacionalizado - é "a lei do menor esforço". Consta que o escritor português José Saramago, quando veio ao Brasil no ano passado, indignou-se ao escutar no saguão do hotel: "Vamos checar...". O Nobel de Literatura não se conteve: "Ora, pois, não se pode mais verificar, averiguar"? O caso é que checar (aportuguesamento do inglês to check) é muito mais fácil de dizer e escrever do que seus sinônimos em português.
Enfim, a língua é mais dinâmica do que os dicionários. Na sua 1ª edição, por exemplo, o Aurélio não consignava o verbo alocar, termo cuja autenticidade hoje ninguém discute. O Aurélio Século XXI ainda não traz os verbos mencionados pela leitora Sandra, mas certamente vai incorporá-los numa nova edição se continuarem a ser usados com freqüência. Ocorre que muitas palavras são criadas por uma necessidade imediata mas não "pegam", morrem na praia. Foi o caso de "imexível" e pode ser o de "customizar", palavrinha difícil de entender. Portanto: agilizar, oportunizar, otimizar, lindar, disponibilizar, acessar, deletar, itemizar, etc., podem ser utilizados... com moderação!

Protocolar e protocolizar
Ambas as formas - já dicionarizadas - têm o sentido de "registrar no protocolo". 'Protocolar' é uma simplificação brasileira do verbo original 'protocolizar', formado pelo adjetivo protocolar + o sufixo izar, que indica ação. Para fugir de possível confusão entre o adjetivo protocolar ["FHC teve com ACM uma conversa curta e protocolar", por exemplo] e o verbo protocolar, um amigo meu utiliza protocolizar quando usa o infinitivo, mas gosta da forma mais rápida e simples nos outros casos:
* Favor protocolizar todos os ofícios, solicitou ela. 
* Afirmou o juiz que o recurso foi protocolado fora do prazo.
* O partido protocolou no Senado denúncia de que o deputado Estevão estaria envolvido em irregularidades na construção do prédio do TJ de Brasília.

Maria Tereza de Queiroz Piacentini
autora dos livros "Português para Redação" e "Só Vírgula"
diretora do Instituto Euclides da Cunha
www.linguabrasil.com.br

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